Este é o livro que escrevo para todos vós. Não tem a forma de um livro nem tão pouco o seu cheiro, não tem páginas, não tem capa nem contracapa. Não tem prefácio nem epílogo, não tem editora nem vai ter lançamento. Não tem nada mas tem tanto de mim. Momentos de toda uma vida vulgar com alegrias e tristezas, lágrimas e gargalhadas, ilusões e desilusões, amores e desamores e tantas coisas banais que marcam a vida de uma pessoa banal. Estas palavras que vos deixo, podem lê-las quando e onde quiserem, podem amá-las ou odiá-las, podem ser-lhes indiferentes, podem fazê-los pensar ou nem por isso.
E logo eu que amo os livros, que adoro folheá-los e senti-los, que absorvo as frases e as histórias, que adoro os autores e as biografias, que amo as livrarias e as bibliotecas. E será isto que escrevo um livro?
O meu livro não tem cor ou se calhar tem, tem a cor da minha alma, do meu coração e do meu pensar.
Este é o meu livro sem forma, que dedico a todos os que me lêem e que dedico sobretudo a mim. Aqui escrevo o que me apetece e o que sinto, uma vezes bem outras assim assim, mas não preciso mudar para publicar nem sequer perguntar se acham bem ou acham mal.
Efectivamente este livro é muito meu. É um imenso eu.
Texto escrito para a Fábrica de Histórias
"Por todo o atelier pairava o aroma intenso das rosas e quando a branda aragem estival corria por entre as árvores do jardim, entrava pela porta a fragrância carregada do lilás, ou ainda o perfume delicado do espinheiro de floração rósea. Estendido no divã de bolsas de seda persas, a fumar, como era seu costume, cigarro após cigarro, Lord Henry Wotton só conseguia vislumbrar do seu canto as flores adocicadas e cor de mel de um laburno, cujos ramos trémulos pareciam mal poder suportar o peso de beleza tão fulgurante."
Oscar Wilde, in " O Retrato de Dorian Gray "
O frufru do vestido de seda preto fazia-se insinuar na sala escura e sombria. Andava de trás para a frente, de frente para trás num frenesim constante. Tinha passado pelo grande espelho que ladeava uma das muitas paredes aristocráticas e tinha olhado de relance. Odiou-se por o ter feito. As rugas marcavam de forma impiedosa o seu belo rosto de outrora que sempre provocara desejos escondidos nos homens por quem passava. Parecia agora um trapo velho e desajeitado. Não conseguiu evitar um grito de ódio, queria ser eternamente jovem, recusava-se a olhar para o espelho mas não conseguia evitá-lo por vezes. Saiu batendo com a porta e de rosto tapado com o habitual véu negro, precipitou-se para a rua pouco movimentada dirigindo-se à velha casa quase abandonada habitada pelo velho chinês que lhe havia vendido o líquido milagroso, o tal que rejuvenescia quando ingerido diariamente. Entrou acelerada insultando o pequeno homem que a olhava quase incrédulo.
- Aquilo que me que me vendeu, aquele líquido que me iria fazer voltar a ser jovem é uma fraude. Não saio daqui sem algo que me faça rejuvenescer. Não aceito ser velha e feia. Já ninguém me olha na rua. E despache-se, tenho pouco tempo.
O velho senhor nada disse e dirigindo-se à salinha repleta de frascos e frasquinhos, mezinhas e outras coisas que tais pegou cuidadosamente num deles dirigindo-se calma e suavemente à dama furibunda que o esperava ansiosa.
- Aqui tem...sabe? Isto é tudo uma ilusão. Nada a fará voltar a ser o que era. Nunca a enganei, sempre fui sincero. Se quiser pode ingerir este, irá ajudá-la na sua infelicidade.
E aproximando-se segredou-lhe ao ouvido palavras que jamais seriam reveladas. Ela abriu os olhos de espanto, atirou com uma nota para cima da mesa e saiu apressada. O coração batia descompassado quando entrou em casa e trancando-se no quarto retirou o véu que lhe cobria o rosto. Olhou-se uma última vez ao espelho, sentou-se na cama agora com uma calma desconcertante e levou o frasco aos lábios já marcados pelo tempo. Bebeu até à última gota e deixando deslizar suavemente o frasco por entre os dedos, deitou-se à espera. Sentiu os olhos fecharem-se sem querer e uma tranquilidade invadiu-lhe o corpo e a alma.
A porta da entrada bateu. Lord Henry acabara de chegar. Só ela já não o ouvia.
Deitou-se na areia molhada e sentiu a água fria daquele mar banhar-lhe os pés suavemente. Inspirou vezes sem conta o ar da praia, achando que aquele era o sítio certo para viver. Tinha feito a escolha ideal, aqueles fins de tarde junto ao mar davam-lhe anos de vida. Não se cansava do barulho peculiar do rebentar das ondas, das conchinhas e dos búzios que jaziam junto às rochas, da brisa fresca a bater-lhe no rosto logo pela manhã, dos pôr do sol inigualáveis e inspiradores.
Há muito que trocara o burburinho e a confusão da cidade pela praia que a acolhera sem quês nem porquês. Comprara casa com varanda virada para o mar, um sítio acolhedor e aconchegante que a recebia de sorriso aberto quando por vezes chegava cansada do trabalho. Considerava-se uma mulher feliz, afinal tinha tudo o que queria, podia contemplar a imensidão daquelas águas que a atraíam de uma maneira para a qual não encontrava explicação. Observou o sol a desaparecer devagarinho junto à linha do horizonte e achou que estava a fazer-se tarde. Por ela ficaria por ali a noite toda, podia até adormecer ao som do enrolar das ondas e acordar apenas na manhã seguinte com o sol a bater-lhe docemente nos olhos doces.
Levantou-se com uma paz que só ela compreendia e sentia. Depois, desenhou um coração na areia.
Rumou a casa onde a esperava o abraço intimista do Ricardo. Já devia estar preocupado ou talvez não. Afinal de contas conhecia-a como a palma da sua mão. Abriu a porta de mansinho e avistou-o na varanda sentado na cadeira de baloiço que tinha comprado para os dois. Quando lhe sentiu os passos voltou-se para trás notando-se de relance um brilho no seu olhar.
- Por onde andaste até esta hora? Aposto que a ver o mar...
Texto escrito para a Fábrica de Histórias
Gostaria de voltar a estar contigo num dia de Primavera, de preferência junto ao rio de águas mansas a ver o sol desaparecer subtilmente na linha do horizonte. Provavelmente falaríamos de coisas banais, do tempo e da temperatura amena, das flores e dos pássaros, dos campos verdes e das papoilas, dos dias que estão maiores e das noites mais pequenas.
Por mim ficaria assim a vida inteira, sem preocupações e lamentos, sem dores nem dissabores, os dois bem juntinhos a ver aquele pôr de sol num fim de tarde soalheira. Recordaria cada Primavera passada na casa da minha infância, o cheiro das rosas e dos lilases, as correrias inocentes pela avenida que floria para nós.
Que tens, perguntar-me-ias ao sentir-me triste.
Nostalgia, queria voltar a ser criança.
Apertar-me-ias junto ao peito e murmurarias ao meu ouvido a mais doce melodia.
Acalma o teu coração de menina... serás sempre minha. Quando eu partir vou nascer de novo para te voltar a encontrar, e acredita, será no mais belo fim de tarde de uma Primavera qualquer.
Texto escrito para a Fábrica de Histórias
Hoje subi ao sotão das recordações.
Vagueei por entre a poeira do tempo, por entre correrias e brincadeiras sem maldade, senti na alma e no corpo o esgar de alguns fantasmas do passado.
Tropecei em mágoas que deixaram cicatrizes, em paixões que deixaram saudade, em máscaras de vida que me ensinaram a viver.
Senti-me aprisionada, ajoelhei-me num cantinho de memórias, deixei cair lágrimas de raiva.
Resumi a vida num dia de Carnaval, senti arrepios de momentos, abracei aquele amor de outrora.
Condenei as injustiças do mundo, acreditei em coisas de paz, enrosquei-me em divagações de esperança.
Imaginei-me criança sem máscara, recordei gargalhadas de um Carnaval distante, reportei-me à minha infância.
Levantei-me apressada, sacudi a poeira do tempo, deixei de ser criança, preparei-me para enfrentar o futuro.
Texto escrito para a Fábrica de Histórias
Estacionou o carro na garagem e saiu compondo o casaco de fazenda vermelho que condizia na perfeição com as botas pretas de bico e cano alto. Fazia questão de andar sempre impecável, herdara isso de sua mãe.
Abriu a porta de casa, largou as chaves do carro e após tirar o casaco e as botas sentou-se exausta no sofá. Tinha sido um dia extenuante, não podia ter muitos mais assim. Levantou-se, achando que se continuasse sentada acabaria por sucumbir ao cansaço. Depois de um longo banho de imersão para descomprimir tomou uma refeição ligeira e já de pijama dirigiu-se calmamente para a sala de cores neutras e sedutoramente aconchegante. Sentou-se e ligou o portátil. Ia falando sozinha e suspirando... tabelas para preencher, papelada para entregar. Sentiu que aquele não era o momento, recusava-se a olhar para qualquer coisa que lhe lembrasse o trabalho. Tamborilou com a ponta dos dedos no computador acabando por tomar a decisão certa.
Clicou na Fábrica para ver o tema. Ainda não tinha tido tempo para o fazer e já estava mesmo no limite. Amava escrever, sentia-se completa quando o fazia... tinha a sensação que ao fazê-lo esquecia-se de um mundo frio e sem cor.
- Hum... Alma Gémea... - franziu o sobrolho.
Não estava de todo inspirada, ia escrever o quê, ou melhor, sobre quem? Alma Gémea... não tinha nenhuma de momento, no passado talvez. Continuou de sobrolho franzido e bem quietinha esperou que ela viesse. Nada. A malandra da inspiração andava a vaguear não sabia bem por onde.
Decidiu que não participaria. Não estava com cabeça para tal, muito menos com ideias. Fechou o portátil bruscamente e dirigiu-se à casa de banho. Olhou-se ao espelho e nele viu reflectida a imagem da mulher que era. Reparou no seu olhar sonhador e sorriu. Concentrou-se no sorriso...transparente como as águas límpidas de um rio. E pensou no que tinha ganho ao longo dos anos, ao longo da vida.
Por entre todos estes pensamentos começaram a surgir as palavras e as ideias sucediam-se em catadupa.
Saiu de rompante da casa de banho, ligou o portátil e achou com a sensatez que lhe era peculiar que não podia deixar fugir a inspiração.
Freneticamente começou a teclar.
Texto escrito para a Fábrica de Histórias
...e lembra-me também no teu sentir e no teu sonhar... lembra-me como uma carícia infinda, pois é assim que eu te vou lembrar... devagarinho e suavemente até o tempo consentir.
P.S. - Não te zangues. Depois da longa carta que te escrevi ainda ficaram algumas coisas por dizer, acho que acontece muitas vezes. Lê-a com toda a atenção, faz as paragens certas nas vírgulas, nas reticências e em cada ponto final. Tudo o que escrevi foram sentimentos em forma de palavras adormecidas... aquelas que gostaria de te ter dito no passado. Absorve cada uma delas e cada frase também... ainda te lembras da minha letra?
Depois de a leres com toda a meiguice, se fores capaz, guarda-a no baú das tuas memórias, talvez um dia possamos falar sobre ela.
Sabes? Tenho um blog. Quem diria, logo eu, a escrever para quem quiser ler. Reptos foi o nome que lhe dei à nascença pois desde o início achei que cada post que fazia era um desafio. Se fores lá espreitar, verás debaixo do título uma das minhas frases favoritas e que acabaste de ler no final da carta que tens nas mãos. Inspirei-me em ti.
Também tu tens um, soube-o por mero acaso do destino. De vez em quando vou lá perscrutar os teus desabafos, é superior a mim, nada posso fazer. Escreves bem, já alguém te disse?
Vou terminar, não te impacientes. Parece que te estou a imaginar "Com tanta lamechice ainda fico enjoado".
Só mais uma coisa e é a última, prometo.
Com tantas palavras escritas acabei por não te dizer o que sinto ou não sinto por ti, se te amo ou nem por isso.
Olha, meu querido, nem eu própria sei, apenas sei que o meu coração inquieto vai deambulando por aí, por vezes longe, algures onde o amor e a ternura se confundem.
É mesmo o fim.
Texto escrito para a Fábrica de Histórias
"Entardecia devagarinho na floresta de árvores centenárias e frondosas. A imensa humidade que se sentia fazia crescer altivos os cogumelos que ela colhia e colocava na cesta com todo o cuidado. Continuando curvada e após a cesta cheia dedicou-se à apanha de ervas de todos os sabores e feitios que utilizava para os seus chás milagrosos. Todos os dias recebia gentes da vila que se dirigiam à sua casa cuidada bem situada no coração da floresta. Iam em busca de cura para as maleitas de que padeciam. Depois de as apanhar e ao chegar a casa, colocava-as em saquinhos de papel pardo que comprava na vila distribuindo-os em cestas variadas para a venda quase diária que lhe dava o sustento.
Quem bebe aqueles chás fica curado, comentava-se na vila. Havia quem lhe chamasse curandeira, outros havia que lhe chamavam bruxa. Nunca fizera nada para que a rotulassem assim, era apenas a maldade a brotar da boca de quem não lhe queria bem. Não percebia porquê. Seria porque escolhera viver isolada na floresta que há tantos anos a acolhia? Ninguém sabia que o fizera para esquecer um grande amor... e apesar de tudo ainda não o esquecera. Esperaria por ele a vida inteira. Era o coração que lhe dizia.
Era amada por muitos, odiada por alguns. Aprendera a viver com aquela mágoa e assim seria até ao fim. Cumpriria o seu destino. No entanto não se sentia só, pois sabia que todos os dias alguém lhe bateria à porta com aquela devoção profunda de quem acredita na cura dos seus males.
A noite caiu densa na floresta de ervas mágicas. Pôs o xaile sobre os ombros e sentou-se na velha cadeira que descansava no alpendre. Da chávena que segurava na mão esguia fumegava um aroma que ajudava quem não dormia em paz, que ajudava quem ainda acreditava no regresso de um grande amor."
- Vô, ela não era bruxa pois não? Contas-me outra história de fadas e duendes?
E o avô com uma paciência infinda começou como começam todas as histórias... era uma vez...
Texto escrito para a Fábrica de Histórias
Passou as mãos enrugadas pelo álbum que encerrava as fotografias da sua já longa vida. Acariciou-o com uma ternura infinda e quase a medo começou a folheá-lo devagarinho. Avançada na idade orgulhava-se da memória que ainda mantinha lembrando-se de pormenores e passagens da vida que era a sua. Não conseguiu evitar um sorriso aos rever as fotos da sua infância a preto e branco pois na altura, cor nem sonhá-la quanto mais vê-la. Continuou a folhear recordando os seus entes queridos na sua maioria já desaparecidos. Parou quando se lhe depararam as do seu casamento, um de muitos dias felizes da sua existência. Cerimónia de pompa e circunstância, afinal casara com o seu grande amor, homem de fortuna avultada. Vieram-lhe à memória as festas para as quais era sempre convidada, as viagens que dera pelo mundo fora, a casa maravilhosa que construíram para os dois. Aproveitara a vida até ao tutano, as suas mãos trémulas e cansadas continuaram a virar cada página amarelecida pelo tempo. Ia sorrindo e suspirando fixando o olhar em si mesma.
- Era mesmo bonita, eu... - murmurou com um orgulho desmedido ao contemplar a sua farta cabeleira negra cor de ébano que contrastava com os seus belos olhos verde mar.
Provocando grandes paixonetas nos homens da vila apenas via aquele grande amor que ainda era o seu.
As passagens de uma vida sucediam-se e fotografia após fotografia deparou-se-lhe aquela página em branco desprovida de qualquer recordação boa, indigna de qualquer perdão. Mudando a expressão, o seu olhar tornou-se baço e sombrio e uma vontade imensa de gritar apoderou-se da sua alma aflita. Manteve o álbum inerte no colo e sentiu as forças desvanecerem. Há muito que arrancara as fotos daquela página e do seu coração. E lembrou-se dela no meio do turbilhão que era agora o seu pensamento... Sofia. Sua amiga desde sempre, não resistira aos encantos do Pedro. E ele não se fizera rogado.
Sentiu a chave na porta. Limpou a lagrimita num ápice, fechou o álbum com violência e ergueu a cabeça num gesto altivo.
- Já cá estou, querida... está um frio na rua!
Pedro beijou-lhe a fronte com ternura e abraçou-a sentando-se a seu lado.
Vozes roucas e enlouquecidas ecoavam na sua cabeça para que lhe perdoasse. Perdoar? Perdoara-lhe a vida inteira.
E as vozes insistiam para que esquecesse. Esquecer? Em tempo algum.
O álbum escorregou-lhe do colo caindo pesado no chão. Da página em branco gargalhadas de escárnio envolveram-na deixando-lhe o corpo gélido como o vento cortante que rugia lá fora.
Texto escrito para a Fábrica de Histórias
O espanta espíritos tilintou quando ela fechou a porta da loja. O frio gélido que se sentia lá fora não convidava de todo à pouca população da aldeia sair à rua. Decorada com gosto invulgar e fazendo lembrar as lojas do bairro de Chinatown, esta de aromas exóticos convidava a entrar. As velas e os incensos expostos com gosto em cada canto e recanto da velhinha loja, ardiam suave e lentamente deixando no ar um rasto de mistura de fragrâncias quase impossível de resistir.
Percorreu a pequena loja com a calma que a caracterizava e aspirou o perfume que emanava de cada vela acesa. Bálsamo, Lótus, Canela, Cedro, Jasmim, Orquídea, Verbena e Âmbar, alguns dos imensos aromas que tinha orgulho em exibir na loja que sempre pertencera à família. Parou junto da essência que lhe lembrava o Miguel...Almíscar... "Sabes o que representa? Amor e envolvimento..." e reportou-se ao passado e às palavras sábias da sua avó que tanto amara e tanto lhe ensinara. Aspirando seguidamente o cheiro a Mirra sentiu-se tranquila... "Acalma os medos..." e as palavras sabedoras da avó ditas num passado recente ecoavam na sua alma apertada de saudade. Dirigiu-se aquela vela especial, Ópio, cuja fragrância adorava particularmente. "Inspiração e serenidade..." dizia baixinho a avó. Depois, Sândalo... e envolveu-se no seu aroma adocicado, afinal fazia parte dos eleitos.
Olhando então para o cantinho mais escondido do seu espaço místico e acolhedor, observou-a. Não estava acesa. Bonjoim e o seu cheiro suave a baunilha. Não conseguia gostar, enjoava-a, mas lembrava-se tão bem das palavras murmuradas..."Aquece e relaxa."
Olhou repentinamente para o relógio. Estava a demorar-se mais que o habitual. Não tardava tinha o Miguel a ligar e a perguntar por onde andava. Começou por apagá-las uma a uma sem no entanto deixar de sentir o seu perfume. Faltava aquela, diferente e quase desconhecida... Vetiver, com o seu cheiro a terra bruta. E a voz ecoava no seu coração..." Altiva a sensualidade, condiz contigo minha querida." - dizia a avó em tom de segredo. Olhou para cima elevando o seu pensamento e todo o seu amor para quem imaginava retratada em cada fragrância, em cada vela que dava vida à sua vida. Soprou, apagou a luz e fechando a porta dirigiu-se para a rua rumo a casa. O tilintar do espanta espíritos ecoou na noite fria.
Um sopro de luz ténue teimava em dar cor à loja de velas e fragrâncias. Pêssego..."Afasta a tristeza, tenta mantê-la sempre acesa."
Um rasto de aroma de fruto invadiu lentamente a velha praça da aldeia num misto de exotismo e oração.
Texto escrito para a Fábrica de Histórias